Mulheres dominam sociedade com choques elétricos em ficção distópica
Quando falei que estava lendo um livro no qual mulheres desenvolviam a habilidade de causar choques elétricos e com isso tomavam o controle da sociedade, alguns colegas não contiveram a risadinha.
Felizmente, eu já havia lido o suficiente de “O Poder” (editora Planeta; R$ 59,90; 368 págs.), da britânica Naomi Alderman, para não desistir da leitura.
Logo no início, ficamos sabendo que a narrativa a ser contada na obra foi criada por um homem (ficcional, claro) cerca de 5.000 anos após um evento conhecido como Cataclismo. Este autor, conhecido como Neil, se corresponde com Alderman e envia para ela o manuscrito do texto para avaliação.
Nada se sabe sobre o período antes do Cataclismo, então Neil faz um relato especulativo de como teria sido essa época. Para o suposto escritor, eram tempos em que homens estavam no topo da sociedade e as mulheres teriam invertido essa ordem ao desenvolver o tal poder.
Margaret Atwood? Sim, muito e descaradamente. Alderman é um tipo de protegida de Atwood, autora do hit “O conto da Aia”, sucesso editorial e também televisivo. Elas foram colocadas em contato através de um projeto de mentoria em artes da Rolex, entre 2012 e 2013 (veja o vídeo em inglês abaixo).
Lições bem aprendidas. Alderman incorpora o espírito distópico e aterrorizante da obra de Atwood, mas sem repetir o estilo da canadense. “O Poder” é, como a própria mentora diz na frase da capa da edição brasileira, eletrizante –coisa que o leitor pode sentir falta no livro “O Conto da Aia”.
A escritora nos entrega um roteiro do período pré-Cataclismo sob a visão de diversos personagens, homens e mulheres, vivendo em uma época não muito diferente da que temos hoje. Quando o poder das mulheres fica mais evidente, o machismo dessa sociedade (nossa sociedade?) fica exposto, escancarado.
Alderman é muito sutil, mas eficiente para passar sua mensagem através de um homem subjugado por mulheres nesse futuro.
O livro também difere de “Aia” por tentar explicar, com alguma ciência, como as mulheres ganharam a eletricidade e como o corpo delas funciona ao dar choques. Em “Aia”, há especulação –das boas– mas não há explicações que se aproximem de ciências como física e biologia, mais comuns nesse tipo de distopia.
“O Poder” foi o ganhador do Baileys Women’s Prize for Fiction de 2017, prêmio concedido a obras escritas por mulheres em inglês. Isso poderia servir de desculpa para alguém tentar categorizá-lo, mas a verdade é que se o livro for rotulado, ele deve então receber a etiqueta de uma das melhores distopias e ficções científicas escritas nos tempos mais recentes.
As habilidades da escritora também já conquistam as telas. Ela é a autora de “Desobediência”, um drama que rendeu um filme atualmente em cartaz no Brasil, e “O Poder” deve em breve ser adaptado como série de TV no Reino Unido.
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