Humanos robóticos enfrentam preconceito em livro de John Scalzi
Em “Encarcerados”, livro do americano John Scalzi, uma gripe severa leva algumas pessoas a um estado de completa incapacidade física –os corpos ficam imóveis, como em um coma, mas o cérebro segue em pleno funcionamento. É a condição causada pela síndrome de Haden.
Após investir toneladas de dinheiro em pesquisa, o governo americano chega a um novo método para inserir os enclausurados na sociedade novamente. A técnica consiste em transferir a consciência dessas pessoas para um robô, totalmente controlado pelo enfermo em seu leito.
Segundo Scalzi, a ideia esteve em sua cabeça por um tempo até ser transformada no livro, publicado no Brasil neste ano pela editora Aleph. “Nesse caso específico, imaginei como seria se tivéssemos uma doença capaz de mudar o mundo, mas sem destruir a população”, afirma.
O autor conta que mergulhou fundo em pesquisas para entender como doenças são transmitidas e como elas afetam nosso corpo e a sociedade para montar a narrativa. Esse conhecimento é encontrado logo no prólogo, onde o escritor estrutura o universo que o leitor encontra nas páginas seguintes.
O mundo retratado na obra, fixado em um futuro próximo, tem de se esforçar para acomodar essas pessoas. Os “hadens” pilotando androides, chamados de C3 (uma referência ao C3PO de “Star Wars”), se tornam uma elite, com corpos de metal resistente e acesso à internet embutido no cérebro.
Para Scalzi, o que é contado no livro já existe de diversas maneiras. A integração homem-máquina, diz ele, não é o futuro da humanidade, mas seu presente.
“Nós já usamos as máquinas para melhorar nossas habilidades, mas não pensamos dessa maneira. Não vemos nossos carros como uma extensão de nosso corpo, por exemplo. Mas o carro mudou a forma como os humanos trabalham, viajam e vivem suas vidas. Nós já somos modificados pelas máquinas, então ter um futuro desses [como no livro] não seria nenhum exagero”, diz.
Os Hadens inegavelmente têm vantagens sobre os demais. Isso inverte a posição dos doentes e faz surgir todo tipo de intolerância e preconceito contra os motorizados.
Esses elementos no livro são intencionais, segundo o escritor. Para ele, todas as formas de preconceito e ódio que já existem hoje e são direcionados a determinados grupos de pessoas ainda estarão por aí em futuro próximo e, inevitavelmente, vão atingir a essa nova classe de humanos, que usa corpos metálicos para andar por aí.
“Ainda não sabemos se o mundo que eu escrevi vai existir daqui a 30 ou 40 anos. Espero ainda estar aqui para ver”, diz Scalzi.
Apesar disso, o personagem principal, o haden Chris Shane, se torna um agente do FBI e vai trabalhar em uma divisão que lida apenas com assuntos relacionados aos seus iguais.
É nessa atmosfera de romance policial que a história se desenvolve. Em alguns momentos, temos a sensação de que o contexto geral é mais interessante do que os crimes que Shane deve resolver, mas o desfecho mostra enfim que as partes estavam de fato conectadas ao todo.
Vale lembrar que mudanças no corpo humano é um tema recorrente para Scalzi. Em um de seus maiores sucessos, “Guerra do Velho” (editora Aleph; 368 págs.; R$ 44,90), as pessoas ganham a oportunidade de se alistar em um exército interplanetário ao completar 75 anos de idade. A partir do alistamento, os novos soldados ganham um novo corpo, sintético e completamente melhorado para enfrentar uma guerra estelar.
ENCARCERADOS (LOCK IN)
AUTOR John Scalzi
TRADUTOR Petê Rissati
EDITORA Aleph
QUANTO R$ 49,90
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